No Brasil colônia, as capitanias podiam ser de duas ordens: principais e subalternas, podendo estar as segundas subordinadas as primeiras. Paraíba, Rio Grande do Norte, Alagoas e Ceará eram capitanias subalternas a Pernambuco. As capitanias eram administradas por três autoridades: o capitão-mor, o ouvidor e a câmara de vereadores.
Os capitães-mores governadores tinham entre
suas funções garantir a defesa da capitania, inspecionar as câmaras e órgãos
judiciais no cumprimento de suas funções, garantir o bom andamento dos
aldeamentos indígenas, comandar as forças armadas da capitania, além de nomear
os comandantes locais dos postos de ordenanças (geralmente latifundiários, que
seriam depois confirmados pelo rei) e distribuir cartas de sesmarias.
Ao longo do tempo os capitães-mores revelavam-se verdadeiros
soberanos absolutos, agindo de forma arbitrária e provocando inúmeros
confrontos ao intervir e perseguir as demais autoridades e administradores.
Forte do Picão ou Forte de São Francisco da Barra foi erguido sobre um recife de pedra em 1614, para proteger o ancoradouro da região portuária, sendo demolido em 1910.
Para se ter uma ideia, até 1700, quando se instalou a
primeira vila no Ceará, todo o poder estava concentrado nas mãos do capitão-mor
e não houve sequer normas escritas até o ano de 1705, pois o governante recebia
apenas instruções verbais de Pernambuco. Nesse mesmo ano foi enfim estabelecido
um regimento para orientar a conduta do capitão-mor governador, o que, em tese,
permitia que os habitantes da capitania reclamassem dos abusos praticados.
navios ancorados ao largo dos arrecifes da Bacia Portuária de Recife, por volta de 1910.
O primeiro capitão-mor do Ceará, após a saída dos holandeses
foi Álvaro de Azevedo Barreto, que tomou posse da capitania em 20 de maio de
1654. As ações iniciais de Azevedo foram no sentido de construir uma capela em
louvor a Nossa Senhora da Assunção, nome, aliás, pelo qual também passou a ser
denominado o forte flamengo de Schoonenborch. No fortim, todo de madeira e em péssimo
estado de conservação, promoveu uma reforma
(só em 1812 a fortaleza passou a ser de alvenaria).
Engenho em Pernambuco, com casa grande e capela
A área em torno da fortaleza não era a mais adequada para se
pensar em colonização. Sem terras propícias à grande lavoura açucareira, ou
sequer um grande rio, a capitania não despertava nenhum entusiasmo. Durante
anos, até que se conquistassem os sertões com a pecuária, a presença europeia
no Ceará, ficou restrita ao fortim do litoral. Era local de uma gente muito
humilde, vivendo de atividades de subsistência.
Eram persistentes as queixas dos capitães-mores do Ceará a
Portugal solicitando providência a qualquer sinal de problemas. As autoridades
sequer os encorajavam a trazer as famílias para a Aldeia do Siará, pois
entendiam não ser conveniente jogá-las em meio a mil percalços, num lugarejo
perdido nos confins do Brasil.
Casa do capitão-mor em Aquiraz
A guarnição do forte era anualmente substituída por outra,
enviada de Recife. Muitos desses soldados eram tidos como indisciplinados em
Pernambuco, e punidos com o degredo no Ceará. Os soldados andavam descalços,
quase nus, salvo um ou outro com camisas e ceroulas de algodão, confeccionados na capitania. No mais, o que se via, era um bando de maltrapilhos, cujos
soldos atrasavam comumente, o que ocasionava inúmeras deserções. O armamento
consistia de meia dúzia de velhas carabinas, quebradas, consertadas com cordas,
quase sem munição.
A pobreza da terra não impedia que navios estrangeiros
viessem praticar contrabando, nos quais se envolviam até capitães-mores – a
exemplo do governador Bento de Macedo de Faria (1682-84) acusado de negociar
com barcos holandeses, cedendo madeiras, gado e cavalos em troca de fazendas e
gêneros.
Casa do capitão-mor em Sobral
Prepotentes e autoritários, os governadores cearenses
estavam sempre em atrito com os religiosos da terra. Em 1787, uma carta dos
párocos das igrejas matrizes da capitania continha denúncias contra o
capitão-mor João Batista de Azevedo Coutinho de Montauri (1782-89). A igreja se
dizia vítima de arbitrariedade daquela autoridade, comparado a Nero e
Diocleciano. Logicamente havia reações contra esses atos autoritários, com
atentados, ameaças e assassinatos, como ocorreu em 1749 quando o capitão-mor
Francisco de Miranda Costa (1746-49) foi morto a tiros, o que levou a o
Conselho Ultramarino em Portugal, a dizer que a maioria dos habitantes do Ceará
era formada por criminosos, e nem todos os homens tinham capacidade para ocupar
aquele governo.
Fonte:
História do Ceará, de Airton de Farias
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