quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

Os Primitivos Governadores do Ceará



No Brasil colônia, as capitanias podiam ser de duas ordens: principais e subalternas, podendo estar as segundas subordinadas as primeiras. Paraíba, Rio Grande do Norte, Alagoas e Ceará eram capitanias subalternas a Pernambuco. As capitanias eram administradas por três autoridades: o capitão-mor, o ouvidor e a câmara de vereadores.  
Os capitães-mores governadores tinham entre suas funções garantir a defesa da capitania, inspecionar as câmaras e órgãos judiciais no cumprimento de suas funções, garantir o bom andamento dos aldeamentos indígenas, comandar as forças armadas da capitania, além de nomear os comandantes locais dos postos de ordenanças (geralmente latifundiários, que seriam depois confirmados pelo rei) e distribuir cartas de sesmarias.
Ao longo do tempo os capitães-mores revelavam-se verdadeiros soberanos absolutos, agindo de forma arbitrária e provocando inúmeros confrontos ao intervir e perseguir as demais autoridades e administradores.


Forte do Picão ou Forte de São Francisco da Barra foi erguido sobre um recife de pedra em 1614, para proteger o ancoradouro da região portuária, sendo demolido em 1910. 

Para se ter uma ideia, até 1700, quando se instalou a primeira vila no Ceará, todo o poder estava concentrado nas mãos do capitão-mor e não houve sequer normas escritas até o ano de 1705, pois o governante recebia apenas instruções verbais de Pernambuco. Nesse mesmo ano foi enfim estabelecido um regimento para orientar a conduta do capitão-mor governador, o que, em tese, permitia que os habitantes da capitania reclamassem  dos abusos praticados.
navios ancorados ao largo dos arrecifes da Bacia Portuária de Recife, por volta de 1910.

O primeiro capitão-mor do Ceará, após a saída dos holandeses foi Álvaro de Azevedo Barreto, que tomou posse da capitania em 20 de maio de 1654. As ações iniciais de Azevedo foram no sentido de construir uma capela em louvor a Nossa Senhora da Assunção, nome, aliás, pelo qual também passou a ser denominado o forte flamengo de Schoonenborch.  No fortim, todo de madeira e em péssimo estado de conservação, promoveu uma reforma  (só em 1812 a fortaleza passou a ser de alvenaria).


Engenho em Pernambuco, com casa grande e capela 

A área em torno da fortaleza não era a mais adequada para se pensar em colonização. Sem terras propícias à grande lavoura açucareira, ou sequer um grande rio, a capitania não despertava nenhum entusiasmo. Durante anos, até que se conquistassem os sertões com a pecuária, a presença europeia no Ceará, ficou restrita ao fortim do litoral. Era local de uma gente muito humilde, vivendo de atividades de subsistência.
Eram persistentes as queixas dos capitães-mores do Ceará a Portugal solicitando providência a qualquer sinal de problemas. As autoridades sequer os encorajavam a trazer as famílias para a Aldeia do Siará, pois entendiam não ser conveniente jogá-las em meio a mil percalços, num lugarejo perdido nos confins do Brasil.


Casa do capitão-mor em Aquiraz

A guarnição do forte era anualmente substituída por outra, enviada de Recife. Muitos desses soldados eram tidos como indisciplinados em Pernambuco, e punidos com o degredo no Ceará. Os soldados andavam descalços, quase nus, salvo um ou outro com camisas e ceroulas de algodão, confeccionados  na capitania. No mais, o que se via, era um bando de maltrapilhos, cujos soldos atrasavam comumente, o que ocasionava inúmeras deserções. O armamento consistia de meia dúzia de velhas carabinas, quebradas, consertadas com cordas, quase sem munição.
A pobreza da terra não impedia que navios estrangeiros viessem praticar contrabando, nos quais se envolviam até capitães-mores – a exemplo do governador Bento de Macedo de Faria (1682-84) acusado de negociar com barcos holandeses, cedendo madeiras, gado e cavalos em troca de fazendas e gêneros.


Casa do capitão-mor em Sobral

Prepotentes e autoritários, os governadores cearenses estavam sempre em atrito com os religiosos da terra. Em 1787, uma carta dos párocos das igrejas matrizes da capitania continha denúncias contra o capitão-mor João Batista de Azevedo Coutinho de Montauri (1782-89). A igreja se dizia vítima de arbitrariedade daquela autoridade, comparado a Nero e Diocleciano. Logicamente havia reações contra esses atos autoritários, com atentados, ameaças e assassinatos, como ocorreu em 1749 quando o capitão-mor Francisco de Miranda Costa (1746-49) foi morto a tiros, o que levou a o Conselho Ultramarino em Portugal, a dizer que a maioria dos habitantes do Ceará era formada por criminosos, e nem todos os homens tinham capacidade para ocupar aquele governo.

Fonte:
História do Ceará, de Airton de Farias  

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