Uma certa sociedade de humanos vivia numa ilha, sem nenhum tipo de contato com outras populações de humanos. A ilha oferecia todas as condições para sua sobrevivência. A alimentação era à base de carne de porco crua.
Esse hábito milenar era praticado sem nenhuma contestação. Um dia, por acidente, os porcos escaparam do curral e fugiram para o interior da floresta. Ali, um incêndio, também acidental, terminou matando-os queimados. Horas depois do incêndio, um morador adentrou a floresta e encontrou os porcos. Ao sentir cheiro de carne assada, achou agradável e experimentou.
A partir desse dia esses humanos passaram a consumir carne de porco assada. Para tanto, reuniam os porcos em currais no interior da floresta e ateavam fogo. Assim, durante muito tempo aquela população se alimentou de porcos assados à custa da queima e destruição das florestas.
Mais tarde, alguns problemas começaram a surgir. Os porcos fugiam durante os incêndios. Passaram então a construir currais cada vez mais eficientes. Surgiu até uma escola técnica de aperfeiçoamento de construção de currais à prova de fugas durante incêndios florestais induzidos.
Um dia alguém observou:
- estamos errados! O problema é outro! Ocorre que este tipo de árvore demora muito a ser incendiada!
Resultados de pesquisas avançadas indicavam que o problema poderia ser solucionado com um novo tipo de árvore, melhorada geneticamente, que apresentasse maior eficiência de combustão em suas folhas, galhos e troncos e, assim, pudesse assar os porcos mais rapidamente, retirando-lhes as chances de fuga.
Passado algum tempo, outro grupo de pesquisadores argumentou que todos estavam errados. Surgia um novo paradigma, uma nova escola de pensamento e ação. O problema residia no fato de os porcos terem pernas compridas, por isso fugiam com facilidade!
Experimentos genéticos levaram à criação de porcos com pernas mais curtas e com reduzida capacidade de percepção ao aumento de temperatura ambiente. As pesquisas foram se tornando cada vez mais sofisticadas, e com o tempo foram escritos livros, tratados e complexas descrições do processo.
Além disso, foram criadas escolas, faculdades, universidades, cursos de especialização e pós-graduação e até uma fundação que apoiava as pesquisas que visavam a eficiência daquele modo de assar porcos na floresta.
Ocorre que a população humana dos ilhéus aumentou, e com ela aumentou a necessidade de assar mais porcos, queimar mais florestas, criar novos empregos, incentivar mais pesquisas, novas especializações, novos cargos, novas empresas, que juntos deveriam crescer e fomentar o progresso.
Mas um dia, alguém ousou contestar aquele modo de produção:
- Não seria mais fácil assar o porco sobre algumas brasas, fora da floresta?
- Não seria mais fácil assar o porco sobre algumas brasas, fora da floresta?
As reações foram violentas. A indignação geral: quem é você para contestar o sistema? Essa solução já não teria sido proposta pelos especialistas se ela fosse viável? E o que faríamos com as centenas de instituições, e os milhares de empregos?
E o sistema continua até hoje, apesar de muitos já terem percebido que algo está errado: as florestas estão acabando, os recursos da ilha se tornaram escassos, o clima está cada vez mais hostil, as pessoas estão angustiadas pela competição e pela incerteza no futuro da comunidade, diante do aspecto de devastação da ilha.
As outras espécies animais sumiram da floresta. Junto com o racionamento de água, vieram a miséria, violência, a insegurança e o desrespeito à dignidade humana.
Algumas pessoas, no entanto, acreditam que os processos precisam ser revistos com a máxima urgência, e que existiem formas mais coerentes de existência, com estilos de vida mais inteligentes.
Extraído do livro Pegada Ecológica e Sustentabilidade Humana
De Genebaldo Freire Dias
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