O Padre José Bezerra do
Vale, pernambucano de nascimento, viveu no antigo município de Bebedouro, hoje
Aiuaba, onde edificou para sua moradia, contando com a ajuda de trabalhadores
vindos de sua terra natal, um dos singulares monumentos sertanejos: a
casa-grande do Umbuzeiro, no primeiro quartel do século XVIII.
A Casa do Umbuzeiro em 1940
Historiadores descrevem
essa rara construção como um quadrado perfeito, onde o
telhado tem a configuração de um triângulo equilátero de qualquer que seja o lado
que se coloque o observador, abrindo-se as janelas para o lado exterior, razão
pela qual não entra a luz do sol, tornando-a escura em toda sua extensão e
compartimentos. Situada a uns 3 quilômetros de Aiuaba, seu nome veio do
umbuzeiro que servia de pousada aos trabalhadores pernambucanos que a
edificaram.
As raízes do povoado que deram origem à atual cidade de Aiuaba são antigas. Talvez fossem vaqueiros os que ali levantaram as primeiras taipas e cozinharam as primeiras telhas. Vaqueiros a pastorar o gado que vinha matar a sede na lagoa fronteira àquele tabuleiro.
As raízes do povoado que deram origem à atual cidade de Aiuaba são antigas. Talvez fossem vaqueiros os que ali levantaram as primeiras taipas e cozinharam as primeiras telhas. Vaqueiros a pastorar o gado que vinha matar a sede na lagoa fronteira àquele tabuleiro.
Igreja N.S. do Patrocínio em Aiuaba - anos 50 - foto IBGE
Na casa do Umbuzeiro com
suas linhas rudes e possantes, elevada num alto ainda existente, morou o padre
José Bezerra, que vivia maritalmente com uma tapuia chamada Páscoa, de quem
houve numerosa e ilustre dependência. O padre vaqueiro dos Inhamuns, era um
daqueles reverendos do sertão primitivo, que celebravam missa de manhã, corriam
atrás do boi, e à noite amavam sua índia e cuidavam de sua prole.
A casa é quadrada, com cerca e porteira na frente, e bem ao lado, corre o riachinho da Toalha. Uma porta à direita de quem entra e três janelas à esquerda, com dobradiças em forma de sino. Portas, janelas, caibros, ripas, linhas de cedro. Dez janelas ao todo. E no centro, naquela obscuridade, onde nunca desce a luz do sol, o altarzinho de tijolo, onde o padre José dizia missa para a indiada, para a sua Páscoa.
De Páscoa resta pouquíssima memória: sabe-se que era gorda e glutona, e como toda índia, de apetite redobrado, pois o elogio maior que se lhe podia fazer era que estava gorda. Do bucho dessa Páscoa saiu muita gente boa: ministros, governadores, deputados, prefeito e até presidentes da República: Wenceslau Brás, Félix Pacheco, Matos Peixoto e padre Cícero Romão Batista, patriarca dos sertões, é o que afirmam alguns genealogistas.
A casa é quadrada, com cerca e porteira na frente, e bem ao lado, corre o riachinho da Toalha. Uma porta à direita de quem entra e três janelas à esquerda, com dobradiças em forma de sino. Portas, janelas, caibros, ripas, linhas de cedro. Dez janelas ao todo. E no centro, naquela obscuridade, onde nunca desce a luz do sol, o altarzinho de tijolo, onde o padre José dizia missa para a indiada, para a sua Páscoa.
De Páscoa resta pouquíssima memória: sabe-se que era gorda e glutona, e como toda índia, de apetite redobrado, pois o elogio maior que se lhe podia fazer era que estava gorda. Do bucho dessa Páscoa saiu muita gente boa: ministros, governadores, deputados, prefeito e até presidentes da República: Wenceslau Brás, Félix Pacheco, Matos Peixoto e padre Cícero Romão Batista, patriarca dos sertões, é o que afirmam alguns genealogistas.
Aiuaba - vista da cidade - IBGE - anos 50
Esta casa do Umbuzeiro
foi também palco de uma tragédia envolvendo um membro da família Feitosa dos
Inhamuns. O sargento-mor João Bezerra do Vale, era irmão do padre José, casado
com uma Feitosa, Dona Ana Gonçalves Vieira, filha do segundo casamento do Coronel
Francisco Alves Feitosa, irmã do capitão-mor Pedro Alves Feitosa e de Manuel
Ferreira Ferro, irmãos por parte de pai, filhos do primeiro casamento de Francisco.
Um dia viajou o sargento-mor, como sempre o fazia, para Pernambuco, sua terra de origem, a fim de visitar a família e vender o seu gado. Demorava sempre nessas viagens o tempo que queria. Naquela, porém, a demora foi maior do que de costume e quando o sargento-mor retornou, chegando à sua fazenda Cabaços, duas léguas de sesmaria abaixo do Cococi, margem direita do Jucá, notou sua mulher, Dona Ana, que ele vinha triste, sem alegria, não demonstrando o menor entusiasmo ao vê-la e aos filhos.
O sargento-mor se apaixonara por uma moça de Recife, Pernambuco, não se sabe bem se moradora de uma das suas propriedades naquela capitania, com a qual havia ajustado casamento, se passando por solteiro. E certo dia, não podendo suportar mais as saudades da amada distante, o marido de Dona Ana chamou à parte os cunhados Pedro e Manuel, confidenciando-lhes que Dona Ana o estava traindo, deitando-se com outro na beira do riacho dos Cabaços, bem atrás da casa.
Ouviram os cunhados ferozes, de cabeça baixa, ruminando vingança, a história do sargento-mor. Porém, disseram que o sargento-mor não se precipitasse no acontecimento. Apurasse tudo direitinho, e apanhando a mulher em flagrante de adultério, punisse Dona Ana dentro das regras do código de honra do sertão: a morte, dela e do amante.
Um dia viajou o sargento-mor, como sempre o fazia, para Pernambuco, sua terra de origem, a fim de visitar a família e vender o seu gado. Demorava sempre nessas viagens o tempo que queria. Naquela, porém, a demora foi maior do que de costume e quando o sargento-mor retornou, chegando à sua fazenda Cabaços, duas léguas de sesmaria abaixo do Cococi, margem direita do Jucá, notou sua mulher, Dona Ana, que ele vinha triste, sem alegria, não demonstrando o menor entusiasmo ao vê-la e aos filhos.
O sargento-mor se apaixonara por uma moça de Recife, Pernambuco, não se sabe bem se moradora de uma das suas propriedades naquela capitania, com a qual havia ajustado casamento, se passando por solteiro. E certo dia, não podendo suportar mais as saudades da amada distante, o marido de Dona Ana chamou à parte os cunhados Pedro e Manuel, confidenciando-lhes que Dona Ana o estava traindo, deitando-se com outro na beira do riacho dos Cabaços, bem atrás da casa.
Ouviram os cunhados ferozes, de cabeça baixa, ruminando vingança, a história do sargento-mor. Porém, disseram que o sargento-mor não se precipitasse no acontecimento. Apurasse tudo direitinho, e apanhando a mulher em flagrante de adultério, punisse Dona Ana dentro das regras do código de honra do sertão: a morte, dela e do amante.
Aiuaba - centro comercial - anos 50 - acervo IBGE
Mas – disseram ainda os
irmãos – que se ele João, nada provasse contra a honra da irmã, o falso
testemunho dele teria seu revide dentro do mesmo código: a morte.Dito por dito, o
sargento-mor meteu uma faca de prata em Dona Ana, mandando-a para o outro
mundo, sem culpa alguma de pecado. Depois, desesperado, o assassino correu para a casa
do mano, a velha casa do Umbuzeiro, onde se deixou ficar trancado, num quarto
escuro. Logo depois, chegaram em sua perseguição, Pedro Alves Feitosa e Manuel
Ferreira Ferro, com suas facas e trabucos e um bom número armado de valentes e
escravos.
O padre José os recebeu como era de hábito, oferecendo-lhes bancos e cadeiras de couro. Sentaram-se diante do padre, que começou a conversa dizendo saber de tudo o que havia ocorrido em Cabaços. Então o capitão-mor Pedro Alves Feitosa mostrou ao padre uma faca prateada, com a lâmina ainda ensanguentada, do crime prometido pelo sargento-mor.
Tranquilamente, ponderou-lhes o padre: – os senhores estão sob o meu telhado. Peço-lhes que respeitem esta casa onde moro. Meu irmão está aqui. Deixem-no sair, sem que lhe seja feito nenhum mal. Daí por diante o resto é com os senhores... é tudo quanto lhes peço.
Ouvindo o reverendo, Pedro guardou a faca na bainha, colocando-a na bota, permanecendo o cabo fora dela. Foi quando Leonarda, uma das filhas do sargento-mor, que estava passando algum tempo com o tio-padre, ouvindo o diálogo, correu sobre o capitão-mor, seu tio, retirando-lhe da bota a faca que matara sua mãe e lançou-a fora da casa por uma das janelas. A faca foi cair no terreiro onde descansavam os animas. Um escravo de Pedro foi buscá-la, mas nunca ninguém a encontrou. Pedro e Manuel foram embora.
João foi-se depois, saindo em paz da casa do irmão padre tomando a direção de Pernambuco. No seu encalço seguiram os dois cunhados vingativos. O certo é que o sargento-mor não apareceu nunca mais no mundo dos vivos. Jamais foi visto nos Inhamuns e em tempo algum chegou ao seio da família em Pernambuco.
O padre José os recebeu como era de hábito, oferecendo-lhes bancos e cadeiras de couro. Sentaram-se diante do padre, que começou a conversa dizendo saber de tudo o que havia ocorrido em Cabaços. Então o capitão-mor Pedro Alves Feitosa mostrou ao padre uma faca prateada, com a lâmina ainda ensanguentada, do crime prometido pelo sargento-mor.
Tranquilamente, ponderou-lhes o padre: – os senhores estão sob o meu telhado. Peço-lhes que respeitem esta casa onde moro. Meu irmão está aqui. Deixem-no sair, sem que lhe seja feito nenhum mal. Daí por diante o resto é com os senhores... é tudo quanto lhes peço.
Ouvindo o reverendo, Pedro guardou a faca na bainha, colocando-a na bota, permanecendo o cabo fora dela. Foi quando Leonarda, uma das filhas do sargento-mor, que estava passando algum tempo com o tio-padre, ouvindo o diálogo, correu sobre o capitão-mor, seu tio, retirando-lhe da bota a faca que matara sua mãe e lançou-a fora da casa por uma das janelas. A faca foi cair no terreiro onde descansavam os animas. Um escravo de Pedro foi buscá-la, mas nunca ninguém a encontrou. Pedro e Manuel foram embora.
João foi-se depois, saindo em paz da casa do irmão padre tomando a direção de Pernambuco. No seu encalço seguiram os dois cunhados vingativos. O certo é que o sargento-mor não apareceu nunca mais no mundo dos vivos. Jamais foi visto nos Inhamuns e em tempo algum chegou ao seio da família em Pernambuco.
foto de Clóvis Jucá
A casa velha do
Umbuzeiro, que foi morada do padre e de sua índia Páscoa, que comia muito e paria
muito, tem fama de mal-assombrada. A gente de Aiuaba conta a história de duas famílias
que nela foram morar e dela saíram ricas, desencavando botijas. A casa do padre
está de pé, solitária e sinistra.
Cercam-na já a lenda e a superstição do sertanejo.
Extraído do livro:
O Clã
dos Inhamuns, de Nertan Macedo
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