terça-feira, 25 de agosto de 2015

Como estava o Ceará na Segunda Guerra

Getúlio Vargas no Governo Central e Menezes Pimentel no Estadual, comandaram o País e o Ceará naquele período

Com a implantação do Estado Novo – regime político implantado pelo presidente Getúlio Vargas em 10 de novembro de 1937, caracterizado pela centralização do poder, nacionalismo, anticomunismo e autoritarismo, que estendeu-se até 29 de outubro de 1945 –  praticamente paralisaram-se as atividades político-partidárias cearenses. O interventor Menezes Pimentel controlava o Estado com mão de ferro, reprimindo, perseguindo e calando a oposição, apoiado que era pelos setores mais reacionários da sociedade, a maioria originária da República Velha, contando igualmente com o aparato administrativo e policial da ditadura getulista e a influência social da Igreja Católica.

Navio brasileiro Alcântara, afundado na Baía de Guanabara pelos alemães

A ocorrência da II Guerra Mundial (1939-1945) e a própria conjuntura política nacional dos anos 40 (pressão para redemocratização do país), todavia, modificaram aos poucos esse quadro de imobilismo. O torpedeamento de navios brasileiros pela Alemanha em 1942, teve muita repercussão no Ceará, despertando um revoltado nacionalismo na população, sobretudo nos estudantes. Estes tentaram realizar manifestações públicas de repúdio ao nazi-fascismo, mas foram, pelo menos a princípio, proibidos pela interventoria. Menezes Pimentel temia que as manifestações juvenis levassem consigo outros segmentos sociais a questionar a ditadura e pedir reformas.

A 18 e agosto de 1942, perante uma nova onde de torpedeamentos de navios brasileiros, realiza-se na capital cearense uma grande passeata liderada pelos acadêmicos da Faculdade de Direito. Tal passeata, feita aos gritos de “morra Hitler e seus asseclas”. Acabou provocando o incidente conhecido como “quebra-quebra”, no qual a massa enfurecida depredou e saqueou vários estabelecimentos e residências pertencentes a alemães, italianos, japoneses e simpatizantes do Eixo, como as Lojas Pernambucanas, a Casa Veneza, a Camisaria O Aluard, o Consulado da Alemanha, o Jardim Japonês, e outros. No dia seguinte, o governo lançou nota oficial prevenindo os pais de família e diretores de colégios de que, se não recolhessem os estudantes, “manteria a ordem com energia” Naquele mesmo mês, o Brasil declarou guerra ao Eixo. 

uma multidão toma o centro de Fortaleza em agosto de 1942, e promove uma violenta manifestação contra os países do Eixo e a indefinição do governo brasileiro diante do conflito

No segundo semestre de 1942, universitários promoveram a I Semana antinazista no Teatro José de Alencar, enquanto o Centro Médico Cearense lançava manifesto a favor da participação brasileira na guerra. Jovens intelectuais realizavam ainda o I Congresso de Poesia do Ceará, desejando expressar o repúdio às ideias de extrema-direita com uma mensagem de paz e culto às artes (desse congresso sairiam as bases para a criação do famoso movimento literário conhecido por CLÃ – Clube Literário e Artísticos). 

Em novembro de 1942 instalava-se a seção local da Liga de Defesa Nacional, que em campanha junto à população, articulou a arrecadação de ferro, alumínio, e outros metais para a construção de artefatos de guerra (capacetes, armamentos, embarcações, etc). A campanha trouxe o “espirito de guerra” à população, fazendo surgir na capital e em outras cidades verdadeiras pirâmides de ferro. Na inauguração delas, acontecia geralmente, uma solenidade simples onde oradores exaltavam os aliados e atacavam os países do Eixo. 

Bombardeiro B-25 no céu de Fortaleza     

O jornalista Jáder Carvalho, por haver pronunciado na instalação da pirâmide Stalingrado, um discurso tido como ofensivo às autoridades – por ter elogiado o comunismo e defendido a libertação de Luís Carlos Prestes – foi processado e condenado a cinco anos de reclusão.

Os jornais locais davam atenção ao confronto. A PRE-9 Ceará Rádio Clube mantinha um programa ao meio-dia dedicado especialmente aos pracinhas (soldados brasileiros que foram enviados para lutar na Europa). Em 1943, os acadêmicos de Direito motivados com os Aliados, dois anos antes do encerramento do conflito, ergueram o obelisco da Praça Clóvis Beviláqua, em comemoração à derrota do nazismo. Os triunfos aliados eram euforicamente recebidos pela população.

A vida cotidiana de Fortaleza, com suas rodas de cadeiras no final da tarde, modificou-se com a participação brasileira no confronto. Houve racionamento de comida, combustível e energia – grandes filas eram formadas para adquirir produtos básicos. Por medida de economia os carros particulares foram proibidos de circular. Foram realizados exercícios de defesa antiaérea, nos quais se desligava a precária iluminação pública, de modo que a cidade ficasse totalmente as escuras à noite para não virar alvo de inimigo. 

Os moradores deveriam tomar seus próprios cuidados nas residências, colocando abajures em volta das lâmpadas e panos ou papelões pretos nas portas e janelas de vidro para não revelar a luz. Decretou-se toque de recolher às 22 horas. Patrulhas do Exército vasculhavam as ruas da cidade e foi criada figura do Inspetor de Quarteirão, um morador da quadra que deveria vigiar o comportamento das demais famílias. 

Desfile dos integrantes da FEB pelas ruas de Fortaleza antes do embarque para a Itália

Cerca de 337 cearenses foram engajados nas tropas da FEB – Força Expedicionária Brasileira, lutando na Itália. Em geral, esses pracinhas vinham de famílias de classe média baixa, originários de vários municípios cearenses. Seis morreram na guerra. 

O ano de 1945 que assinalou o fim do conflito, encontrou o Ceará com aproximadamente 1 milhão e 500 mil habitantes, dos quais apenas 205 mil residiam na capital. Continuava a ser um Estado rural e pobre, com enorme concentração latifundiária e profundas contradições sociais, cuja economia girava em torno do comércio e do binômio pecuária-agricultura. As atividades industriais eram pequenas, limitadas quase ao uso de algodão e ao beneficiamento de algumas oleaginosas como oiticica e mamona. 

Fortaleza constituía-se o grande polo de desenvolvimento, estando já consolidada sua condição de centro hegemônico urbano do Estado. Nela esta centrada a sede do governo e as estruturas do serviço público e privado, sendo o ainda inconcluso Porto do Mucuripe seu mais importante canal de escoamento da produção interiorana, e de recepção dos produtos industrializados de outras regiões e do exterior. Outras cidades como Crato, Juazeiro e Sobral, devido ao comércio, também prosperavam, mas em grau menor.  

fonte:
História do Ceará, de Airton de Farias

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