Padre Cícero Romão Batista, o patriarca de Juazeiro do Norte
No dia 1° de março de 1889 o vilarejo de Joaseiro, então com
menos de 10 mil habitantes, se prepara para mais um dia de oração e trabalho. O capelão da igreja da pequena vila, Cícero
Romão Batista, dá início a primeira missa do dia, depois de uma noite de
vigília em desagravo ao Coração de Jesus. No pé do altar, um grupo de beatas,
entre as quais se encontrava Maria Magdalena do Espírito Santo Araújo, mais
conhecida como Maria Araújo. Teria sido mais um dia normal na vida do povoado,
se não tivesse acontecido um fato inusitado.
Na hora da comunhão, a hóstia consagrada que para os católicos é o corpo,
sangue de Cristo, se transformou em sangue na boca da beata Mara Araújo.
Beata Maria Araújo, cuja história "foi apagada" depois do episódio do milagre
O fato se repetiu dezenas de vezes. Os católicos do vilarejo
interpretaram o fenômeno como um novo derramamento do sangue de Jesus, sendo,
portanto, um milagre, versão aceita também pelo Padre Cícero e outros
sacerdotes das redondezas. Assim, o
povoado, antes insignificante, passou a receber grande visitação popular.
Quando ainda era uma vila pertencente ao Crato, Juazeiro não passava de um
aglomerado de casas de taipa e algumas de tijolos, convergindo para uma capela
dedicada à Nossa senhora das Dores. O vilarejo nasceu à sombra de três
frondosos juazeiros, em frente a uma pequena capela, a margem da antiga estrada
que ligava os municípios de Crato e Missão Velha.
Cidade de Juazeiro entre as décadas 1920/40.
imagem: http://www.skyscrapercity.com/showthread.php?t=903370
Era o entreposto dos que se dirigiam ao Cariri. A notícia do
milagre se espalhou por todo o Nordeste. Começaram as romarias. A primeira delas
ocorreu no dia 7 de junho, sob o comando do reitor do Seminário São José do
Crato, monsenhor Francisco Monteiro, que organizou procissão de cerca de três
mil pessoas, que saíram do Crato para Juazeiro, a fim de observar a transformação
da hóstia em sangue. O ato litúrgico terminou com uma homilia do monsenhor
Monteiro exaltando o milagre.
Juazeiro do Norte em foto antiga
imagem: http://www.skyscrapercity.com/showthread.php?t=903370
Cauteloso, Padre Cícero solicitou a formação de
uma comissão de profissionais da saúde e por padres da região para investigar o
fenômeno.
Após longos estudos, depois de testemunhar o fenômeno da transformação
da hóstia em sangue por diversas vezes, a comissão concluiu que a ciência não
tinha como explicar os fatos extraordinários corridos em Juazeiro. Dom Joaquim
José Vieira, que era segundo bispo de Fortaleza com jurisdição em todo o Ceará,
enviou uma comissão da própria igreja para averiguar os fatos, liderada pelos
padres Clicério da Costa Lobo e Francisco Ferreira Antero, os melhores teólogos
do Ceará, para analisar o caso. A conclusão desta primeira comissão eclesial,
que permaneceu durante mais de um mês em Juazeiro, entrevistando pessoas,
assistindo as transformações das hóstias e verificando outros fenômenos que
aconteciam com a beata Maria de Araújo, foi que os fatos eram milagres.
Dom Joaquim José Vieira
Dom Joaquim não aprovou o longo relatório escrito por estes
padres e nomeou uma segunda comissão. Após três dias, nos quais deu a comunhão
a beata, os encarregados, padres Antônio Alexandrino de Alencar e Manuel Cândido, declararam que o fenômeno de sangramento da
hóstia não acontecera. A beata argumentou que o milagre não aconteceu porque um
dos padres que acompanhavam a comunhão não estava em estado de graça. Em represália,
conta-se que Maria de Araújo foi punida com 12 pancadas de palmatória nas mãos.
Ainda segundo a história, a beata foi enclausurada na Casa de Caridade por
ordem de Dom Joaquim, que também suspendeu as ordens sacerdotais de Padre
Cícero, Monsenhor Monteiro, Padre Costa Lobo e Padre Antero, porque se
recusavam a acreditar que o milagre fosse uma fraude.
velório do Padre Cícero
http://www.portaldejuazeiro.com/2011/07/rede-cebs-de-comunicacao-apresenta-77.html
Mesmo diante da negação do milagre por parte da igreja, Juazeiro virou centro de peregrinação. A notícia sobre o fato se espalhou como um rastilho de pólvora. Leva de romeiros chegavam diariamente ao povoado, que para eles, era o chão sagrado, a terra prometida. A população do povoado triplicou em menos de um ano. Com o crescimento de Juazeiro começa a via-crúcis de Padre Cícero, sobre quem desaba uma campanha de inveja, intrigas e perseguições, além de ser suspenso da ordem e proibido de oficiar atos religiosos. Os romeiros que não podiam encontra-lo na igreja, se conformavam em ouvi-lo diariamente em sua casa, em busca de conselho e proteção espiritual.
Nos últimos anos de vida padre Cícero tornou-se obcecado em recuperar os plenos poderes do sacerdócio, o que jamais conseguiu. Pensou em ir a Roma novamente, mas as condições físicas não lhe permitiam. Padre Cícero faleceu no dia 20 de julho de 1934.
fonte:
História do Ceará, de Aírton de Farias
Jornal Diário do Nordeste
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