Quando o então padre Antônio
Tabosa Braga – mais tarde Monsenhor Tabosa – criou o Leprosário Antônio Diogo,
com o apoio financeiro do industrial Antônio Diogo de Siqueira, o fez com a
melhor das intenções, uma vez que a lepra já se propagava pelo Estado, havia uma preocupação crescente por parte da população devido ao medo do contágio, e por amor aos doentes, que viviam pelas ruas, principalmente da Capital, sem assistência médica ou qualquer tipo de apoio.
O
religioso iniciou uma grande campanha sensibilizando a população para o
problema dos hansenianos. Construiu então no Morro do Croatá um modesto abrigo,
onde os doentes podiam ter algum descanso e ajuda espiritual. Um dos
internos do que foi considerado o primeiro hospital hanseniano, conta que o
religioso foi pessoalmente assistir a chegada dos doentes, e fazer a entrega
solene da nova “cidade”, onde poderiam transitar normalmente, sem o risco de
serem expulsos. E continuou assim, durante todo o resto de sua vida trabalhando
infatigavelmente pelo leprosário, com o fim de proporcionar o necessário
conforto a seus moradores.
Monsenhor Tabosa e Antônio Diogo de Siqueira
Para assegurar a estabilidade
do estabelecimento, confiou a sua direção às Irmãs Capuchinhas, e nomeou
capelão o padre Joaquim Severiano de Vasconcelos. No dia da inauguração, não
contente de ter ido deixar os doentes na sua nova moradia, Monsenhor Tabosa cumprimentou
um por um, passou com eles o dia inteiro, e se encarregou de armar, todas as
redes e camas.
O Leprosário de Canafístula foi
inaugurado em 9 de agosto de 1928, no Distrito de Canafístula, atual Antônio
Diogo, município de Redenção, nas dependências onde antes já funcionara a
Colônia Cristina, que abrigara flagelados da grande seca de 1877/9. Depois que
a Colônia foi extinta, em 1925, abrigou a primeira prisão agrícola do Estado, e
por fim, o leprosário, a partir de 1928. Construída com a ajuda financeira do industrial
Antônio Diogo de Siqueira, a instituição foi mantida por doações de populares e
uma ajuda governamental até o início dos anos 40, quando passou a ser mantido pelo
governo estadual.
Colônia Christina
No Brasil, até meados do
século XX, os portadores da hanseníase eram obrigados a se isolar em
leprosários, uma política que visava o afastamento dos doentes por meio de
internação compulsória em vez de um tratamento efetivo.
Essa política do isolamento foi adotada no governo de
Getúlio Vargas, durante a década de 1940. Pela lei, qualquer pessoa
diagnosticada com a doença era imediatamente levada para os chamados hospitais-colônia.
Os afetados ficavam confinados em pequenas cidades construídas para esse fim, no
caso do Ceará, os leprosários situados em Redenção e Maranguape. Para os
doentes, ingressar nos muros de uma dessas instituições significava deixar tudo
para trás.
Leprosário Antônio Diogo
O leprosário denominado Colônia de Canafístula, teve duas inaugurações: a primeira, no dia
1° de agosto de 1928, somente com a presença de autoridades evitando o contato
com os doentes, que só chegaram ao local no dia 09 do mesmo mês.
Os pacientes foram
transportados de trem, partindo de Fortaleza. Foram embarcados nas proximidades
da igreja dos Navegantes, com paradas previstas em estações intermediárias a
fim de receber outros doentes que porventura houvesse nas localidades. Chegaram
ao leprosário no dia 9 de agosto, em número de 44 pacientes, sendo 35
procedentes de Fortaleza e os demais de várias localidades. As instalações eram
precárias: nenhuma mobília, nada de equipamentos, sem saneamento básico, água
potável lavanderia ou energia elétrica. Os pacientes aglomeravam-se em redes
estendidas e separadas apenas em ala feminina e masculina. O primeiro paciente
a ser registrado naquele 9 de agosto de 1928 foi o agricultor Raimundo Gomes,
de 32 anos. Ele não resistiu nem ao primeiro ano de internamento, faleceu no
início do ano seguinte.
Mantido por doações e contando com uma
ajuda financeira do Estado, o lazareto passava por muitas privações. Em abril
de 1929, foi feito um apelo pela imprensa no sentido de se obter maiores
recursos para manutenção do lugar. Como resultado, o governo aumentou o valor
de sua contribuição. Em 1929, o Dr. Samuel Uchoa ao assumir a direção do
Serviço de Saneamento Rural, resolveu priorizar investimentos no leprosário, e
iniciou um movimento em favor dos filhos sadios dos pacientes, inaugurando a 29
de maio de 1930, a Creche Silva Araújo, que contava com dois dormitórios de 15
lugares cada um, para meninos e meninas. A exemplo do que já ocorria com o
lazareto, a direção da creche também, foi confiada às Irmãs Capuchinhas.
Apesar de as autoridades terem passado
a dar mais atenção ao leprosário, a crise se aprofundava e a doença se
alastrava. No início dos anos 30, a colônia de Antônio Diogo já abrigava mais
de 200 doentes, além dos muitos que perambulavam esmolando pelas ruas de Fortaleza, que não
eram recolhidos ao Leprosário por falta de vagas.
Nos anos 40 foi criado o
Serviço de Profilaxia da Lepra, através do Decreto-Lei n° 686, de 13 de março
de 1940, durante o governo do interventor Menezes Pimentel, o que deu novo
impulso ao tratamento e controle da hanseníase no Ceará. O Serviço de Profilaxia
encampou o Leprosário Antônio Diogo, que tornou-se instituição estadual
subordinada ao Departamento Estadual de Saúde e passou a ser denominada Colônia
Antônio Diogo. Em 12 de agosto de 1977, tornou-se Hospital de Dermatologia
Sanitária Antônio Diogo, através do Decreto Estadual nº 12.435. Depois foi
transformado no Centro de Convivência Antônio Diogo que congrega e assiste
ex-pacientes e seus familiares, que não puderam ou não quiseram abandonar o
local depois de curadas da hanseníase.
a Lei Federal nº 610, de 13 de
janeiro de 1949, recomendava o isolamento compulsório dos pacientes em colônias,
chamadas à época de leprosários. A mesma lei ordenava a entrega dos bebês de
pais com hanseníase à adoção, o que levou à separação de milhares de famílias.
Esta situação perdurou até 1986, quando os antigos hospitais colônias foram
transformados em hospitais gerais.
Além do isolamento, até meados
do século XX, os doentes tinham seus pertences queimados, uma política que
visava muito mais ao afastamento dos portadores do que a um tratamento efetivo.
Apenas em 1962 a internação compulsória dos doentes deixou de ser regra. No
Ceará, até 1973, eles ainda eram segregados nos leprosários.
O
fim do isolamento compulsório decretou a libertação dos doentes que viviam
confinados entre os muros da Colônia, possibilitando a reintegração no seio da família
e da sociedade da qual foram compulsoriamente excluídos. Mas, boa parte dos
antigos internos, não conseguiu se readaptar a essa nova vida, seja por terem
perdido por completo o contato com os familiares, seja por ainda se acharem
discriminados.
Atualmente cerca
de 100 pessoas moram nas dependências do Centro de Convivência, que completa 91
anos em 2019. A unidade abriga 42 pacientes remanescentes da Colônia de Antônio
Diogo em dois pavilhões, e 65 casas, quase todas ocupadas por famílias de
ex-internos. O equipamento atua com um serviço ambulatorial de dermatologia
para atendimentos de pacientes da unidade e da região, promovendo reabilitação
física e social.
Fontes:
Feitosa, Adilia Maria
Machado. A Institucionalização da Hanseníase no Ceará: do Leprosário de
Canafístula ao Centro de Convivência Antônio Diogo. 2008. Dissertação de Mestrado
em Políticas Públicas. Universidade Estadual do Ceará. 2008.
Leite Filho, Rogaciano. A
História do Ceará passa por esta rua. Fortaleza, Fundação Demócrito Rocha,
1988.
Doentes ainda sofrem isolamento.
Jornal Diário do Nordeste, edição de 19 de agosto de 2014
fotos:
Brasiliana Fotográfica, Fundação Fiocruz e Centro de Convivência Antônio Diogo
Fátima, só agora, infelizmente, conheci seu blog. Que maravilha. Por que você parou? Você está fazendo outro trabalho? Obrigado.
ResponderExcluirEugenio
estamos voltando. Obrigada pela companhia
ExcluirMuito bom!
ResponderExcluirEsse centro de convivência tem muita historia, aí viveu a irmã Priscila, natural de Quixeramobim e que deticou sua vida em ajudar o próximo.
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