A crise da república Velha atingiria seu ápice com a
grande depressão mundial iniciada em 1929, em virtude da quebra dos Estados
Unidos – o que abalou as exportações de café, principal sustentáculo das
oligarquias dominantes – e com as eleições presidenciais de 1930, quando um
desentendimento entre São Paulo e Minas Gerais levou ao fim definitivo da
chamada política café com leite.
Interventor Fernandes Távora em companhia de algumas autoridades em 1930: da esquerda para a direita, sentados: Moraes Correia; Juarez Távora; José Américo; Fernandes Távora; José de Borba; e César Cals. Em pé, na mesma ordem: João da Silva Leal; Magalhães Barata; Antônio Martins Almeida; Djalma Petit (piloto); Virgilio Moraes; no meio do grupo, ainda menino, o futuro governador Virgilio Távora; Landry Sales; Faustino Nascimento; e Tertuliano Siqueira. (Arquivo Nirez)
Assim, os paulistas lançam Júlio Prestes para suceder
Washington Luís na presidência do país, enquanto Minas gerais, Paraíba e Rio
Grande do Sul formavam uma chapa oposicionista, a Aliança Liberal, em torno dos
nomes de Getúlio Vargas para presidente e João Pessoa para vice.
Usando de fraudes, violências e da máquina
governamental, Júlio Prestes venceu o pleito. O resultado desagradou a
segmentos da classe média, burguesia e oligarquias dissidentes. Estes, então,
contando com o apoio de tenentes e usando como pretexto o assassinato de João
Pessoa, iniciaram a 3 de outubro, um movimento armado – a chamada “Revolução”
de 30 – na qual foi deposto o presidente Washington Luis, entregando-se o poder
a Getúlio Vargas.
No Ceará, quando das eleições presidenciais de 1930,
coube ao governador Matos Peixoto comandar o processo oficial de fraudes,
subornos, violências e perseguições aos opositores da Aliança Liberal, cuja
campanha no Estado foi entregue ao Partido Democrático de Fernandes Távora. Júlio
Prestes venceu no Ceará, com larga margem de votos sobre Getúlio. Derrotados na
possibilidade de chegar ao poder pelas urnas e sofrendo perseguições das
oligarquias, os aliancistas passaram a articular a revolta armada que, no Norte
e Nordeste foi coordenada pelo tenente Juarez Távora de seu QG na Paraíba.
Além dos meios civis liderados por Fernandes Távora, a
conspiração se fez sentir com maior intensidade entre os jovens oficiais do
23°Batalhão de Caçadores e do Colégio Militar, como os tenentes Landri Sales
Gonçalves, Júlio Veras, Carlos Cordeiro de Almeida, Ari Brígido Correia,
Antônio Martins de Almeida, João da Silva Leal e outros.
Embora os militares cearenses não tenham promovido
levantes armados como em outros Estados, as ideias tenentistas faziam
ressonância entre eles. Por ocasião da Revolta do Forte de Copacabana em 1922,
planejou-se sem êxito, uma revolta em Fortaleza, à frente da qual estava o
capitão Atahualpa de Alencar Lima, sob cujo comando, certo dia os alunos do
Colégio Militar desfilaram pelas ruas de Fortaleza, entoando a canção de
protesto “Seu Mé” (referência ao presidente Arthur Bernardes), o que motivou
grave incidente com a guarda policial do presidente Justiniano de Serpa.
A partir de 1927, ainda que pese a representação
governamental, os segundos-tenentes recém saídos da Escola Militar Ladri Sales
e Júlio Veras iniciaram um processo de desenvolvimento das ideias
revolucionárias entre um pequeno e seleto número de militares do 23° BC. Quando
foram ambos transferidos para o Colégio Militar, ali também conseguiram
adeptos.
Em 1929, as ideias tenentistas no 23° BC
intensificaram-se com a chegada do segundo-tenente Carlos Cordeiro, que
estendeu seus pensamentos a outros oficiais e até a soldados, cabos e
sargentos. Portanto, ao romper a “Revolução de 30”, boa parte dos militares
cearenses estava doutrinada para a luta.
Com o início da revolta, no dia 3 de outubro, o governador
cearense Matos Peixoto, tomou várias providências, entre as quais reforçar o
policiamento da capital, censurar a imprensa, suspender o tráfego de trens em
todo o Estado e efetuar a prisão de vários aliancistas locais, como a de
Fernandes Távora.
Tal repressão frustrou, num primeiro momento, o
movimento revolucionário no Ceará. Em consequência, os tenentes Landri Sales,
João da Silva, Júlio Veras e Ari Correia entre outros, fugiram para a Paraíba.,
lugar em que o movimento no Nordeste era mais forte e para onde haviam sido
deslocados os efetivos do 23° BC. Ali aqueles tenentes seguindo instruções de
Juarez Távora, sublevam o 23°BC, num combate em que morreu o seu comandante, o
governista capitão Pedro Ângelo.
Um a um caíram os governos do Nordeste: Paraíba,
Pernambuco, Rio Grande do Norte, enquanto os efetivos do 23ºBC iniciavam a volta,
de Sousa para Fortaleza. No percurso, os revolucionários começaram o processo
de desarme da jagunçada e coronéis do Cariri. A 7 de outubro, já estando a
“Revolução” vitoriosa no País e não tendo como resistir, Matos Peixoto
renunciou à presidência do Ceará e embarcou para o Rio de Janeiro.
A notícia foi recebida com euforia pelos setores
urbanos. Uma multidão entusiasmada se formou na Praça do Ferreira para
comemorar o ocorrido. Fernandes Távora foi liberto, carregado nos braços do
povo e aclamado novo governador do Estado – o que mais tarde seria confirmado
por Getúlio Vargas.
Já como presidente Getúlio Vargas visita o Ceará, na foto entre o interventor Menezes Pimentel e a professora Alba Frota. A esquerda, de paletó branco, está o prefeito Raimundo de Alencar Araripe. Ano 1940, tempos de Estado Novo.
A revolução de 30 triunfava no Ceará. Mas, a exemplo de
1889, quando da Proclamação da República, as frágeis oligarquias tradicionais
eram momentaneamente afastadas do poder por um evento de caráter nacional.
Transferiu-se o comando do Ceará para um grupo oligárquico dissidente (os
Távora) e para elementos da classe média. O movimento representou um golpe no
poder dos coronéis latifundiários. Chegou-se a pensar que era o fim das velhas
oligarquias, uma vez que os próprios domínios do Padre Cicero chegaram a ser
vasculhados e seu retrato foi retirado da sede da Prefeitura de Juazeiro (a
cidade que ele fundou).
Desarmou-se a jagunçada, combateu-se o cangaço,
nomearam-se bacharéis para administrar os municípios do interior. Mas tudo isso
se constituía uma ilusão, porque não se tocou na base de poder das elites
nordestinas, o latifúndio. Os coronéis e as oligarquias continuariam a ter
influência ainda que submetidos ao poder nacional de Vargas.
Extraído do livro
História do Ceará, de Airton Farias
Nenhum comentário:
Postar um comentário