Na Capitania do Ceará, no período colonial, uma das
grandes preocupações tanto das autoridades quanto das elites latifundiárias era
controlar a população pobre e os indígenas, obriga-los a trabalhar e a
produzir, sobretudo quando da expansão da cotonicultura no final do século
VXIII. Uma das formas utilizadas para coagir a população era ameaça de
recrutamento para os grupamentos militares e policiais. Prática largamente
usada, o recrutamento colocava em pânico a massa, pelo tratamento brutal
dispensado aos convocados.
Praça Carolina, atual Praça Waldemar Falcão
No dia 3 de setembro de 1817, o Governador Sampaio recebia
uma Carta Régia comunicando-lhe o consórcio do Príncipe D. Pedro I com a
arquiduquesa Carolina Josefa Leopoldina Francisca Fernanda de Habsburgo-Lorena
, que ocorrera no dia 3 de maio daquele ano em Viena, Áustria. Este acontecimento tão longínquo foi o motivo para
darem o nome de Praça Carolina ao principal largo da Fortaleza de então. O Engenheiro Silva Paulet alinharia o lado
ocidental da praça que mais tarde seria ocupado por residências. Em 1814, foi construído na praça, o primeiro Mercado Público.
Não havia critério, nem organização regular, nem
planejamento. Tudo dependia das necessidades do momento e do arbítrio das
autoridades. o procedimento era simples: fixadas as necessidades dos quadros,
os agentes recrutadores saíam a cata das “vítimas”; não havia hora ou lugar em
que se sentissem a salvo, porque os agentes invadiam casas, forçavam portas e
janelas, entravam até pelas escolas e salas de aula para arrancar os
estudantes.
Planta do forte de N.S. da Assunção s/data.
Quem fosse julgado em condições de tomar as armas, era
incontinenti, arrebanhado e levado aos postos. Explica-se assim, o porquê de,
ao menor sinal de recrutadores próximos, a população desertasse dos lugares
habitados, indo refugiar-se no mato. Logo que começavam a levar recrutas, era
infalível o aumento de preço dos gêneros de primeira necessidade, porque os
lavradores abandonavam as roças.
O governador Sampaio usou muito desse mecanismo para
combater a vadiagem. Embora houvesse leis tratando sobre o recrutamento,
Sampaio chegou a comunicar às autoridades que era preferível alistar apenas os
vadios, que prejudicar a agricultura; ou seja, por conta própria o governador
alterou a legislação de recrutamento (todos poderiam, em tese, ser convocados),
visto que deveriam ser chamados ao serviço militar apenas os que nada produziam
ou faziam, devendo ser poupados os trabalhadores da agricultura.
O Governador
Manuel Inácio de Sampaio e Pina foi um dos mais
polêmicos governantes cearenses, lembrado como eficiente administrador, e ao
mesmo tempo, como um homem autoritário e ambicioso. Nas realizações materiais
determinou a reconstrução da fortaleza de N. S. de Assunção (10ª RM), o
erguimento do primeiro mercado público da capital e a implantação do primeiro
plano urbanístico de Fortaleza, projetos de Silva Paulet.
A casa que pertenceu a José Antônio Machado e onde estiveram diversos órgãos públicos, foi a primeira sede dos Correios. Foi demolida para a construção do Fórum Clóvis Beviláqua.
Em 1812, Sampaio instalou a repartição local dos
Correios (até então o correio só existia para comunicações oficiais, através
dos denominados “positivos” pessoas de confiança). Mantinha permanente
correspondência com as autoridades das Vilas, de quem exigia informações
periódicas com o propósito de tomar conhecimento sobre os mais diversos
acontecimentos da capitania.
Não se pode dissociar essa preocupação de Sampaio com
o clima vivido no Brasil em decorrência das agitações revolucionárias da Europa
do começo do século XIX. Em 1816, para melhor “aplicar a lei e manter a ordem”
criou-se uma segunda comarca judicial no Ceará, localizada no Crato (a sede da
primeira comarca passou então, de Aquiraz para Fortaleza).
Tido como homem inteligente, culto, assim dado às
armas como às letras, o governador teria lançado as bases literárias do Ceará
ao promover outeiros, reuniões literárias realizadas no palácio do governo.
Não obstante as realizações, Sampaio mostrou-se
autoritário ao perseguir e reprimir adversários. Daí bateu-se com o capitão-mor
Antônio Moreira Gomes, rico comerciante português e homem de muito prestígio na
terra. Sampaio, coagindo a Câmara Municipal, conseguiu que os vereadores
cassassem o posto de Gomes. Da mesma maneira confrontou-se com o ouvidor João
Antônio Rodrigues de Carvalho, e com o naturalista João da Silva Feijó.
No quesito servilismo, mandou que a população da vila
de Fortaleza festejasse com luminárias, por três noites consecutivas, o
nascimento do filho de Dom Pedro Carlos, o infante Dom Sebastião de Bourbon e
Bragança. Quando foi notificado da morte de Dona Maria I (primeira rainha reinante
de Portugal), em 15 de junho de 1816, determinou que todo povo da vila e
distritos vestisse luto rigoroso por seis meses e aliviado por outros seis.
Atendendo que os pobres e os escravos não podiam
atender rigorosamente a esta determinação, por questões econômico-financeiras,
permitiu que os homens trouxessem no chapéu e as mulheres na cabeça, qualquer
retalho preto. Os que se recusassem seriam punidos com 30 dias de cadeia, para
cada vez que fossem pegos sem o distintivo.
Ao reprimir a “Revolução” de 1817 no Ceará, Sampaio
chegou a acusar adversários políticos de estarem envolvidos na revolta, visando assim,
livrar-se dos opositores. O governador deixou o Ceará em janeiro de 1820 quando
foi assumir o governo de Goiás. Faleceu em Portugal no ano de 1856. A rua Governador Sampaio no centro de Fortaleza,
recebeu esse nome em homenagem a esse governante português.
Fontes:
História do Ceará, de Airton de Farias
Ceará (homens e fatos), de João Brígido
fotos do arquivo Nirez
fotos do arquivo Nirez